segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Ilha Grande - 02-03/11/2012

Eu bem que queria colocar aqui o tracklog gerado pelo meu GPS, embarcado no Google Maps. Mas acontece que esquecemos o aparelho ligado na volta para o Rio e o sistema de buffer circular com pouca memória fez com que todo o nosso percurso fosse sobrescrito pela viagem de ônibus de Angra ao Rio. Por isso, segue esse mapa que mostra as trilhas e que pode ser usado para acompanhar o relato:



A caminhada foi de uma barca (em Abraão) à outra (em Araçatiba), que partiu desta praia 5 minutos após nossa chegada. Somaram-se cerca de 15h acumuladas de caminhada. Fazendo questão de passar o domingo em casa, convenci meu amigo Gabriel de não darmos a volta completa, mas apenas meia-volta. Dessa forma, nosso plano era fazer Abraão - Dois Rios - Paranaioca no primeiro dia e Parnaioca - Aventureiro - Provetá - Araçatiba no segundo. Foi quase isso.

RIO DE JANEIRO - VILA ABRAÃO

A forma mais comum de ir à Ilha Grande é pegando a barca que vai de Mangaratiba (ao sul de Angra dos Reis) até a Vila Abraão, que é a vila mais populosa, próspera e movimentada da ilha. Chegamos à rodoviária do Rio pouco antes da 5h00 da manhã do dia 2, para pegar o ônibus das 5h00. A aventura já começa na rodoviária: o cara emitiu duas passagens e disse que aquelas não eram as passagens para Mangaratiba, mas que as usaríamos para entrar no ônibus para Mangaratiba. Como eu ainda estava meio sonolento, fiz questão de pedir para ele repetir, apostando que havia entendido errado. Mas não, era isso mesmo. Vai entender! E a brincadeira fica ainda mais interessante quando entramos no ônibus para Mangaratiba. O motorista pega as passagens (que não eram para Mangaratiba) e diz para nos sentarmos nas nossas poltronas, que eram da 40 em diante. Sim, isso mesmo, qualquer poltrona com numeração igual ou maior que 40. Ele falou a mesma coisa para mais algumas pessoas, e no final todo mundo foi sentado sem problemas. É o meu Brasil funcionando.

O ônibus deixa-nos em frente ao porto de embarque em Mangaratiba, de onde se pega a barca até a Vila Abraão. A barca comporta 500 pessoas e estava quase lotada. Eu, ainda morrendo de sono, vez ou outra era acordado pelos aplausos e gritos entusiasmados de um grupo de umas 20 pessoas ao nosso lado, cada vez que alguém na barca vomitava. Uma hora vi que a mulher que sentava à minha esquerda preparava-se para vomitar em uma sacola e me distanciei um pouco, pois sabia que só teria oportunidade de tomar banho à noite.

Por volta das 10h00 chegamos à Vila Abraão, com tempo nublado e às vezes chuviscando. O visual de praia com montanhas é interessante.


Vila Abraão

VILA ABRAÃO - DOIS RIOS


Depois de uma dar caminhada pela vila e comer algo numa padaria, começamos, por volta das 11h00, a caminhada pela trilha T14 até a vila de Dois Rios. Na verdade não é muito próprio chamar aquilo de trilha. É mesmo uma trilha até um certo pedaço, quando se encontra uma pequena estrada de chão que liga as duas vilas.

Deixando Abraão para trás

Um tangará na trilha

Chegamos a Dois Rios pouco antes das 13h00. Até 1994, a vila de Dois Rios abrigava um presídio, que foi então desativado e hoje é um pequeno museu. Presos famosos já passaram por ali, como Madame Satã, o traficante Escadinha (foi dali que ele efetuou a épica fuga de helicóptero) e Graciliano Ramos (que foi preso político por suposto envolvimento com comunistas durante a era Vargas).

Chegando em Dois Rios

Dois Rios

Presídio de Dois Rios

Depois de uma breve visita ao presídio, fomos comer no único estabelecimento da vila que serve refeições. O Gabriel observou que era a primeira vez que ele via engradados de Caninha 51. Acho que também era o meu caso. A facada de R$16,00 por pessoa é incompatível com a qualidade da refeição servida, com destaque para o peixe forrado de espinhos. Valeria muito a pena ter levado um fogareiro e preparado nosso próprio miojo com sardinha.

Le restaurant gastronomique à R$16,00

Outro problema do estabelecimento é a demora: passaram-se 1h15 desde o momento em que pedimos o prato até terminarmos de comer. Mas chega de reclamar.


Praia de Dois Rios
DOIS RIOS - PARNAIOCA

Uma passada rápida para ver a praia e, às 13h20, tomamos a trilha T16 em direção à Parnaioca. Trilha clara, consolidada, bem batida, sem desafios e sem surpresas. Para turista mesmo. Nessa trilha, observamos pela primeira vez algo que era percebido durante toda a caminhada na ilha: quase todos os riachos estavam secos. Embora o tempo estivesse úmido e chuviscoso, há tempos não chovia de verdade na região e a estiagem era clara no sistema de drenagem das montanhas.

Trecho da trilha T16

Riacho seco

Aqui também tem árvores bicentenárias

Aqui também tem bambuzal

Por volta das 17h30 chegamos à Parnaioca, onde pretendíamos acampar. Logo atrás da praia há um camping simpático e convidativo. Fomos dar uma olhada na praia, onde encontramos um cara local chamado Alexandre, com quem começamos a bater um papo. Eu perguntei se ele considerava uma boa ideia ir naquele mesmo dia até a Praia do Aventureiro. Ele disse que sim, que não havia grandes percalços. Apenas era necessária um pouco de atenção no costão que separa a Praia Sul da Praia do Aventureiro, pois quando a maré está cheia as ondas podem atingir o trecho onde se atravessa. Ele também nos explicou que é proibida a entrada nas praias Leste e Sul, mas que a guarda florestal só trabalha das 6h00 às 18h00 e que todo mundo que atravessa a ilha passa por lá. Então vamos. Às 17h50 partimos para atravessar a pequena Parnaioca em busca da trilha que leva à Praia do Leste (e que não consta nos mapas, pois é proibido entrar lá).

Panorama da Parnaioca

Igrejinha na Parnaioca

Pequeno riacho no fim da Parnaioca

PARNAIOCA - PRAIA DO LESTE

Passando o riacho ao fim da praia, a entrada da trilha está discretamente escondida. Perdemos cerca de meia hora tentando encontrá-la. Por volta das 18h40 achamos a trilha e começamos a subir. Essa trilha naturalmente é bem mais fechada, pois é bem menos frequentada. Dá para ganhar uns arranhões no braço e saborear algumas teias de aranha. 

Às 19h17 chegávamos (foras-da-lei) à Praia do Leste. O visual é inóspito. Uma praia gigantesca e absolutamente deserta. O desnível entre a faixa de areia e a restinga lembra um muro, o que dá a impressão de se estar num lugar civilizado, mas não é o caso. Olhando no horizonte é possível ver a ilha que separa as praias do Leste e do Sul.

Ao fundo, a ilha que separa as Praias do Leste e do Sul

Praias do Leste, do Sul e do Aventureiro vistas no Google Maps

Olhando para trás: à esquerda, o "muro" da restinga

Olhando para frente: é chão que some na neblina

PRAIA DO LESTE E PRAIA DO SUL


A ilha que separa as duas praias tem de ser transposta por trás, onde se forma um grande mangue. Segundo o Alexandre da Parnaioca, era possível atravessar o mangue andando sem problemas, pois a água nunca passa da cintura. 

Não recordo bem que horas chegamos à beira da ilha. Alguém já havia passado por ali naquele dia, deixando escrita a palavra LOBISOMEN (assim, com letras capitais e terminando com N) na areia, em dimensões que seguramente permitiam que a inscrição fosse vista dos aviões comerciais que sobrevoam a Ilha Grande na rota Rio - São Paulo. 

Tentamos achar uma alternativa a atravessar o mangue, mas evidentemente não havia: se houvesse, é por lá que as pessoas normalmente iriam. Entramos na água que estava pululando de (acredito) pequenos peixes. Logo que entramos a noite caiu e escureceu totalmente. Com lanternas de cabeça, fomos adentrando o mangue, cuja vegetação ia ficando mais espessa, deixando cada vez mais apertado o "túnel" de árvores sob o qual avançávamos. A profundidade deixava a água um pouco acima da cintura no trajeto todo. Ali não tiramos fotos, pois manter a mochila e e as botas fora da água e ainda segurar um facão (afinal que surpresas pode oferecer um mangue no meio do nada?) mantinham as mãos bem ocupadas. O "túnel" no mangue é um só, então não vimos grandes chances de pegar a direção errada.

A caminhada na Praia do Sul  (a maior e mais isolada praia da Ilha Grande) se deu à noite. Fomos com as lanternas apagadas para economizar pilhas. De vez em quando ligávamos uma lanterna e ficávamos impressionados com a quantidade de caranguejos sobre a areia. Tentamos registrar tirando fotos com flash, mas não deu certo.

SHOULD I STAY OR SHOULD I GO?

Também não sei ao certo que horas chegamos ao fim da Praia do Sul. Alí há um costão que a divide da Praia do Aventureiro. No momento não sabíamos que estávamos diante de um trecho que oferece risco considerável. A rocha do costão é extremamente íngreme, e em vários pontos há água escorrendo, o que a torna extremamente escorregadia. À noite, só com a luz das lanternas, de fato faltou informação visual para decidir o que fazer. O Gabriel queria avançar, mas eu insisti em voltarmos para a Praia do Leste e acamparmos ali, pois a claridade do dia nos daria as respostas que não estávamos encontrando naquele momento. A coisa é realmente perigosa: logo abaixo o costão forma um paredão rochoso onde as ondas batem revoltosas (é mar aberto). Escorregar ali com certeza não é uma boa ideia. E eu sinceramente não via possibilidade de atravessar sem um grande risco de escorregar. Convenci o Gabriel: voltamos e armamos acampamento.

PRAIA DO SUL - PRAIA DO AVENTUREIRO

Por volta das 06h45 acordei, abri a barraca e vi o belo visual da imensa praia deserta. Comemos, desarmamos a barraca, mochila nas costas e fomos em direção ao costão que nos fez ficar por ali na noite anterior.

Vista da barraca para a Praia do Leste

Vista da barraca para a Praia do Aventureiro

A barraca em frente a uma placa de "proibido acampamento"

O início do costão

Não tiramos fotos durante a travessia do costão porque as mãos estavam ocupadas em nos manter vivos, mas segue um pequeno relato. Na noite anterior eu percebi que não havia como passar sem atravessar um trecho muito íngreme e muito molhado. Dormi muito curioso sobre como se daria aquela travessia. A luz do dia trouxe a resposta: neste trecho existe um pequeno desnível na rocha, em que é possível pisar enquanto se completa a travessia apoiado à parede. Há um ponto em que esse trecho some e reaparece mais à frente, exigindo um passo bem grande com as pernas. Descrição que pede fotos, mas infelizmente é só o que temos. O fato é que dá para atravessar esse costão, mas são necessárias calma e atenção. Depois, segue-se uma caminhada pela superfície rochosa do costão até a Praia do Aventureiro, que no pedaço inicial é chama de Praia do Diabo (com certeza uma alusão ao costão).

Chegando à Praia do Diabo, às 8h45, vinha ao nosso encontro um grupo de três guardas florestais. Chegaram perguntando de onde viemos. A resposta foi uma tentativa de fuga pela direita: de Abraão. "Por onde?" é claro. "Por ali", apontamos para o costão. Depois de ouvirmos um justo sermão que incluía o valor da multa a ser paga por invadir a reserva, pedimos desculpas pelo transtorno e seguimos em direção ao Aventureiro. Não fomos multados: a praxis é mesmo apenas dar o sermão.

Pedras que dividem a Praia do Diabo da Praia do Aventureiro

O famigerado costão visto da Praia do Aventureiro

Igrejinha na Praia do Aventureiro

Chama o Monet! - Praia do Aventureiro

A Praia do Aventureiro é muito bonita. É uma pena o dia estar nublado. O ponto mais famoso da praia é um coqueiro torto, que caiu de uma encosta num desabamento, não morreu e continuou crescendo para cima.

O coqueiro que é atração turística na Praia do Aventureiro

PRAIA DO AVENTUREIRO - PROVETÁ


Comemos e, pouco antes das 10h00, partimos em direção a Provetá pela trilha T9. Por volta das 11h30 já avistávamos a praia de cima do morro. É uma enseada bem abrigada, como pode ser visto no mapa lá em cima. Às 12h00 em ponto chegamos à praia.

 Provetá vista do caminho que vem da Praia do Aventureiro

Provetá tem uma característica interessante: toda a vida social da comunidade parece girar em torno da igreja. Isso costuma ser comum em pequenas vilas de pescadores, mas aqui há uma peculiaridade: ao invés de uma capelinha de Nossa Senhora d'Alguma-Coisa, a igreja é uma Assembléia de Deus. Em conversas posteriores com outras pessoas que visitaram essa praia, ouvimos relatos que confirmam a importância que essa igreja tem na rotina e nos costumes da vila e como isso se reflete num notável conservadorismo dos locais. Algo em que reparamos é que absolutamente ninguém anda sem camisa. Quando chegamos (sem camisa) e cruzamos a principal rua da cidade, logo percebemos que nosso estilo estava sendo reprovado e vestimos as camisetas fedidas e encharcadas de suor.

Em Provetá algumas casas oferecem almoço aos turistas e passantes. Almoçamos numa dessas casas e, pouco antes das 13h30, pegamos a trilha T8 em direção a Araçatiba. Essa trilha é em boa parte acompanhada por uma linha de distribuição de energia elétrica, o que dá um ar de se estar em lugar civilizado, diferente dos caminhos que levam até ali.

PROVETÁ - ARAÇATIBA - ANGRA DOS REIS

Às 14h30 chegamos chegamos a uma pequena praia antes de Araçatiba, mais uma pequena trilha, e às 14h45 chegamos a Araçatiba. Lá descobrimos que um barco saía às 15h00 para Angra dos Reis. Tchau!

Praia antes de Araçatiba


Araçatiba

Cais de embarque onde pegamos o barco para Angra

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Travessia Ciririca - Graciosa

Já havíamos feito três incursões à trilha do Marco 22, cada vez descobrindo um pedaço maior da trilha. Na terceira, eu e o Joel chegamos ao imponente Salto Mãe Catira, subimos a encosta e fomos parar em cima do cânion de diabásio.  Na quarta-feira anterior ao fim de semana combinado para a travessia, fomos ao Clube Paranaense de Montanhismo para assistir a uma palestra do veterano Henrique (Vitamina) Schmidlin sobre a história da Serra da Prata. Lá perguntei ao Julio Fiori, que já fez a travessia algumas vezes, qual era a melhor maneira de transpor o Salto Mãe Catira. Ele respondeu à pergunta e teceu uma preciosa lista de dicas que seriam essenciais para a travessia. A partir daí só dependíamos de bom tempo e "sangue no zóio".


Depois de um entra-e-sai de gente ao longo dos meses de planejamento, na sexta-feira a equipe estava definida em seis pessoas: eu (Thiago Passarin), Joel Köster, Thiago Mayer, Gustavo Gomes, Carlos Larrosa e Roger Fiusa. Fomos na sexta-feira à noite à Fazenda Bolinha onde, sob o assoviar dos macucos, armamos acampamento e discutimos alguns detalhes, ansiosos pelo dia seguinte. No primeiro dia iríamos até a Colina Verde, onde acamparíamos para no segundo realizar a parte mais desafiadora da travessia, que envolve a Colina Verde, o Rio Forquilha, a cela entre o Tangará e o Cotoxós (ou Coxotós?) e o Rio Mãe Catira.

A equipe partindo da Fazenda Bolinha

A TRILHA DE BAIXO DO CIRIRICA

Partimos às 6h30 da manhã do sábado em direção ao Ciririca pela trilha de baixo. O sol de manhã estava de rachar, mas a trilha é toda dentro da floresta, então isso não foi problema. às 10h04 estávamos na Cachoeira do Professor, ou seja, o ritmo não estava tão ruim para o tamanho da equipe e o fato de estarmos carregando cargueiras.

Pausa rápida na Cachoeira do Professor

Quando chegamos à pedra mirante antes do Última Chance, observamos que a serração estava tomando conta da serra, o Anhangava já não podia ser visto. No Última Chance nos abastecemos de água e tomamos fôlego para enfrentar a rampa do Ciririca com cargueiras nas costas. No meio de uma das estiagens mais longas que já vivenciei em Curitiba, tínhamos quase certeza que os riachos dos vales da Colina Verde estariam secos. Eu não acreditei tanto nisso (me enganei!) e subi com apenas dois litros. O Thiago Mayer e o Carlos carregaram cada um cinco litros d'água Ciririca acima!

A subida do Ciririca foi pesada, claro, mas sem percalços e sem esgotar as energias de ninguém. Dos seis membros da equipe, apenas dois já tinham ido até lá: eu de ataque, duas semanas antes, e o Joel para acampar, alguns meses atrás.

Carlos subindo a rampa. Sem grampos porque o Ciririca é o Ciririca,  né Joel?

A encosta norte do Ciririca e muitas nuvens

Cume do Ciririca. Vamos jogar um basquete?

Por volta das 13h30 estávamos na segunda placa. Havia muitas nuvens ao redor e em raros momentos foi possível ver a silhueta do Agudo da Cotia. Almoçamos sem muita pressa e às 15h04 iniciamos a descida pela encosta sul do Ciririca. Eu realmente não entendi como não tinha conseguido achar a trilha da encosta sul quando fui lá duas semanas atrás. Enfim, lá fomos nós.  Talvez a maior perda em função do céu fechado de nuvens é não poder ver os Agudos na descida do Ciririca. Pra ilustrar o que quero dizer, segue a foto abaixo, tirada duas semanas antes.

Os Agudos da Lontra, Cotia e Cuíca vistos do Ciririca (duas semanas antes)

A DESCIDA DA COSTA SUL DO CIRIRICA

Dali pra frente, era tudo novidade para todo mundo. Nenhum de nós havia descido em direção aos Agudos. Alguns relatos que havíamos lido falavam sobre trechos dramáticos de corda e estávamos curiosos para encontrá-los. E realmente é uma descida difícil e delicada, com longos trechos de corda escorregadios e bastante íngremes. Tem uma corda que acaba longe do chão, obrigando a pessoa a cair cerca de um metro. Fiquei me perguntando como se sobe aquilo. Mas o nosso objetivo era a travessia. Algum dia num, ataque ao Cotia, hei de experimentar a subida.

Joel numa das cordas da descida do Ciririca para os Agudos

Roger em outra corda

A neblina nos impedia de ter noção da dimensão dos precipícios pelos quais passávamos. Fotografei o mais impressionante deles mas, como será relatado adiante, cheguei sem minha câmera ao final da travessia.

Às 16h18 passávamos o riacho e a curva em "S", que pode ser definido como o pé do Ciririca na direção sul. A partir dali já estávamos no altiplano entre o Ciririca e os Agudos, um dos trechos mais remotos da Serra do Ibitiraquire. Eu queria entender um pouco de botânica para compreender a vegetação que cobre os vales que estão entre as colinas daquele trecho. É uma vegetação ligeiramente esparsa com árvores finas e de médio porte, muito interessante e muito diferente do que se vê do outro lado da serra. Fica aqui o incentivo aos entendidos do assunto para escreverem um pequeno artigo ou prepararem uma palestra sobre a vegetação desse trecho da serra. Com certeza vários aventureiros ficarão satisfeitos em compreender um pouco sobre essa curiosa flora. Tentei registrar em fotos, mas quem frequenta a serra sabe como é difícil capturar em foto as peculiaridades, as dimensões e a beleza de certos trechos. Ainda mais quando se perde a câmera! Mais à frente estão algumas fotos dos vales tiradas no segundo dia.

A COLINA VERDE

Fomos percorrendo os campos de altitude com pouquíssima visibilidade em função da neblina e lamentávamos estar perdendo o que certamente é uma das vistas mais espetaculares da Serra do Mar. Mas paciência, um dia refaremos com tempo aberto. A trilha ali é bem batida e não inspira dúvidas. Às 17h28 chegávamos ao ponto de acampamento da Colina Verde. Como já mencionado antes, tinha razão quem achou que os riachos da região estariam secos. A turma do banana boat (por causa das capas amarelas das mochilas) se deu bem depois de carregar tanta água morro acima e morro abaixo. O Joel e o Gustavo foram até a trilha do Agudo da Cotia para buscar água num suposto riacho que passa por lá. Eu sabia que meu último litro de água era suficiente para a noite e a refeição da manhã, pois logo que partíssemos a jornada seria por rios. Armamos o acampamento e vi que ali havia sinal de celular, então pude ligar para casa para dizer que estávamos vivos e bem instalados. Onde? Muito difícil de explicar.

NOITE DE APREENSÃO

Todos se recolheram cedo porque a neblina estava tão espessa que era quase uma garoa. Eu dormi literalmente sorrindo imaginando a chegada ao Marco 22 no dia seguinte. Desde abril planejamos essa travessia. Maio e junho desse ano foram obscenamente chuvosos, dando uma arrefecida nas atividades de montanha de todo mundo. Depois, quando o tempo melhorou e o inverno seco chegou, eram os calendários que raramente batiam e as incursões ao Mãe Catira que sempre pediam uma nova incursão. Havíamos definido a data de 18 e 19 de agosto quase um mês antes, sem saber se o tempo estaria bom. E no dia 2 de setembro eu me mudaria de Curitiba, tornando muito difícil a realização depois dessa data.

Às 20h30 todos já estavam dormindo e os roncos ecoavam nos campos. Às 21h30 acordei com o barulho da chuva na barraca e pensei comigo mesmo "não é possível!" A chuva foi se intensificando, vi que o Joel (com quem eu dividia a barraca) também havia acordado e começamos a discutir a possibilidade de abortar a travessia caso a chuva persistisse pela manhã. Ambos achávamos que seria a decisão correta. Queira ou não, o que tínhamos pela frente no dia seguinte é considerado o trecho mais desafiador da Serra do Mar paranaense. Nenhum de nós conhecia o trecho, não sabíamos onde estávamos nos enfiando. Ao passo que a trilha da encosta sul do Ciririca é a trilha do Ciririca, uma trilha consolidada, relativamente frequentada e bem marcada, embora difícil. Foram momentos de apreensão. Lembrei de um relato de uma dupla casca-grossa, referência do montanhismo paranaense, que dali do acampamento da Colina Verde havia ligado para saber a previsão do tempo, pois concluir a travessia debaixo de chuva pode ser perigoso. Ouvi a conversa do Roger e do Carlos na barraca ao lado, que eram unânimes em concluir a travessia e não voltar sob hipótese alguma. Isso seria uma discussão complicada de manhã se o tempo não melhorasse, mas realmente acreditamos que a chuva não iria durar tanto. Pouco antes das 00h30 a chuva foi parando até que parou completamente e podia-se até ouvir um grilo cantando. A partir daí eu dormi sossegado. Mais uma vez a serra me havia dado uma baita injeção de adrenalina. Não será isso mesmo que procuramos?

RUMO AO RIO FORQUILHA

Às 04h30 do dia 19 os celulares começaram a despertar. Destaque para a música do despertador do Joel: "Levanta gaúcho! Todos precisam andar!" O Thiago Mayer saiu da barraca e nos informou que algumas estrelas podiam ser vistas no céu. Mandei mensagem para meu amigo Peron pedindo a previsão do tempo para Curitiba, Antonina e Morretes. Ele respondeu dizendo que era de sol o dia todo para as três cidades. Excelente, sem chances de termos de abortar a travessia.

A dica do Julio era clara: com visibilidade, ir em direção ao Arapongas. Sem visibilidade, azimutar 235 graus na bússola e tocar pra frente. Não tínhamos visibilidade mas a trilha estava (mais ou menos) batida no chão, então a princípio não atentamos para a bússola. A trilha cruza um pequeno vale em direção nordeste e acaba. Antes disso há um bifurcação. Voltamos à bifurcação e vimos que o outro ramal da trilha faz uma pequena volta e segue na direção dos 235 graus. Aí não tivemos mais dúvidas, era por lá mesmo. É engraçado como o senso de direção se perde com pouca visibilidade e depois de algumas curvas. Em certos momentos podíamos jurar que estávamos voltados para uma direção quando na verdade encarávamos a direção quase perpendicular.

Os campos da Colina Verde na manhã do segundo dia

Eu havia traçado no GPS um caminho pelo que parecia ser no Google Earth o trajeto mais limpo para cruzar a Colina Verde em direção ao afluente do Forquilha, mas não o utilizamos. Aliás, nesse trecho não utilizamos o GPS, que serviu mais para registrarmos as chegadas nos pontos-chave da caminhada e para coletar o tracklog. Observando com atenção, era possível seguir a trilha levemente batida. No chão há gretas enormes e muito fundas encobertas pela vegetação. Sabemos de gente que já caiu ali ficando preso pela mochila. Pouco depois das 07h00 a carta topográfica e a bússola contrariavam totalmente a intuição e nos diziam que estávamos perto do afluente do rio Forquilha no qual deveríamos entrar. Estudadas com calma e atenção, as elevações e vales que a neblina às vezes nos permitia enxergar batiam perfeitamente com a carta topográfica. Em dado momento foi possível visualizar uma pequena espinha de montanha que corria sentido noroeste à nossa esquerda, uma maior à frente que descia sentido norte-sul, e mais adiante um pedaço da encosta do Arapongas. Tivemos certeza de que se tratavam das espinhas que formam os vales do afluente e do Rio Forquilha, respectivamente. Pela primeira vez naquele dia estávamos certos de onde estávamos e para onde íamos. Ali eu sabia que qualquer riacho nos levaria para o Forquilha, que é o principal rio da região.

Orientação visual: as espinhas de montanha e a encosta do Arapongas

OS AFLUENTES E O RIO FORQUILHA

Descendo um vale com mais um tipo de curioso de vegetação, chegamos às 7h31 a um leito seco de rio. Descemos um pouco por este leito e finalmente chegamos ao afluente do Forquilha que procurávamos. Ali sim, nenhuma foto é capaz de capturar a beleza do lugar.

A curiosa vegetação dos vales

Piscina no afluente do Rio Forquilha

"Túnel" de árvores sobre o afluente do Rio Forquilha

Pouco mais de 200 metros depois de onde entramos no afluente, há outro leito de riacho chegando, e ali há uma fita da travessia Alpha-Crucis. Provavelmente alguns grupos entram por ali, fazendo um caminho ligeiramente diferente do nosso.

Fomos percorrendo o afluente. Em certo momento antes de atingir o Forquilha, esse afluente tem um trecho de pedras gigantes e contínuas com um tom vermelho enferrujado bem marcante. Sabíamos que não deveríamos entrar ali, pois é tão escorregadio e íngreme que fica quase impossível avançar com segurança. Exatamente no momento em que as pedras vermelhas tornam-se visíveis, surge um riacho paralelo à esquerda, e foi por ali que seguimos até que ele desembocasse no Rio Forquilha, onde chegamos às 8h57. Descendo o Rio forquilha, o trecho mais interessante é uma cachoeira de cerca de dez metros que temos de transpor. É necessário todo cuidado, pois a rocha molhada é bem escorregadia. Infelizmente as fotos tiradas de baixo ficaram borradas.

Roger, Joel e Gustavo descendo a cachoeira no Rio Forquilha

Eu e o Joel na cachoeira no Rio Forquilha

No mapa está claro: quando o Rio Forquilha faz a curva para a direita, é hora de sair do rio à esquerda e começar a subir a encosta buscando a cela entre o Tangará e o Cotoxós. Além disso, sabíamos que haveria duas fitas amarelas na margem esquerda e uma na margem direita, sinalizando o ponto exato de saída. O que não sabíamos (e não percebemos no mapa) é que existe uma curva à esquerda antes daquela em que deveríamos sair. Como as nuvens impediam a visualização de qualquer tipo de referência visual fora do rio, ficamos procurando a saída depois da primeira curva. Até que eu peguei o GPS e pude constatar que ainda faltavam cerca de 150 metros para a "verdadeira" curva à esquerda, cujo ponto eu havia marcado do Google Earth antes de sair de casa. A diferença de ângulo no fluxo do rio entre um trecho e outro é extremamente pequena, dificultando uma decisão baseada na bússola sobre estar ou não no ponto certo. Por isso um GPS na primeira vez que se realiza esse percurso é importante.

As duas curvas do Rio Forquilha. Atenção para sair apenas na segunda!

SUBINDO A ENCOSTA EM BUSCA DA CELA

Andamos mais alguns minutos e finalmente, às 10h30, achamos a fita indicando a saída à esquerda. Uma etapa importante da travessia havia sido concluída e estávamos prestes a subir o conjunto que divide as águas do Rio Forquilha e do Rio Mãe Catira, conjunto formado pelos morros Tangará, Cotoxós e Arapongas. O objetivo era chegar à cela entre o Tangará e o Cotoxós para então descermos pelo Rio Mãe Catira desde a sua nascente até a trilha que leva ao Marco 22 da Graciosa. Algumas dezenas de metros acima da saída do Forquilha, caímos no leito de um riacho, o qual fomos subindo acompanhando a marcação recente com fitas amarelas. A dica do Julio era tender sempre à esquerda depois que o riacho sumisse, mesmo contrariando a intuição, senão cairíamos no cume do Tangará. A procura pelo ponto de cela entre o Tangará e o Cotoxós é sem dúvida o momento mais crítico da travessia em termos de orientação, sem contar o mato fechado, as unhas-de-gato, o bambuzal denso, os caraguatás gigantes e os troncos impedindo a passagem. Não há rio nem trilha que guie, a angulação da encosta vai mudando e nunca temos certeza de estar ou não indo na direção certa. Por vezes uma silhueta de cela fica visível no fundo da floresta, mas as dimensões das coisas são grandes demais e é difícil navegar grandes distâncias ali com certeza do que se está fazendo. Eu tinha marcado no GPS os cumes do Tangará e do Cotoxós, e de vez em quando calculávamos a proporção da distância da nossa localização até cada um deles para tentarmos nos localizar no mapa. Isso também garantiria que percebêssemos caso transpuséssemos a encosta para o outro lado.  Num dado momento, o Joel estava convicto que deveríamos caminhar à direita seguindo a curva de nível e logo alcançaríamos a cela. Eu e os outros preferíamos subir mais, pois receávamos ainda estar em altitude mais baixa do que a cela e, se isso fosse verdade, navegar à direita em curva de nível nos faria ir indefinidamente na direção do Cotoxós e depois do Arapongas. Nesse momento o Joel se separou do grupo, avançando um pouco mais por baixo. Mantivemos contato por voz o tempo todo, e logo o Joel gritou empolgado que havia achado a cela. Corremos todos na direção de onde vinha a sua voz, e lá estava a cela entre o Tangará e o Cotoxós, um trecho plano dividindo as duas encostas, e no meio dele o tubo de PVC contendo o livro de assinaturas. Corremos para baixo, ou seja, estávamos mais altos do que a cela.

O grupo na cela entre o Tangará e o Cotoxós

Éramos o terceiro grupo a assinar o livro naquele ano. O primeiro foi um grupo que realizou a travessia no carnaval e o segundo foi a dupla do Alpha-Crucis, que realizou a Ciririca-Graciosa acompanhado de mais uma pessoa. Quando fui sacar minha câmera para documentar o momento percebi que ela havia caído. Ela provavelmente caiu pouco antes de alcançarmos a cela, num trecho cheio de cipós. Pensei em voltar para procurar, mas seria muito mais difícil do que procurar uma agulha em um palheiro. O melhor era descansar um pouco, assinar o livro e tocar pra frente. Eram 12h02, e tínhamos um Mãe Catira inteiro pela frente.

O RIO MÃE CATIRA

Eu ainda tinha uma única curiosidade com gosto de preocupação: será segura a transposição do Salto Mãe Catira? Fora isso, eu sabia que não haveria percalços, pois parte da caminhada seria sobre o trecho mais seco do Mãe Catira e a outra parte (depois do Salto) eu conhecia muito bem das incursões anteriores. Minha aposta era de que concluiríamos a travessia às nove da noite, e as apostas de todos os outros eram mais otimistas.

O leito do Rio Mãe Catira começa bem alto na encosta sul do Tangará-Cotoxós, a poucos metros da cela. Ali é a nascente deste que é o principal Rio da região. Que me corrijam se eu estiver falando besteira, mas digo que estávamos sobre um importante divisor de águas, já que o Mãe Catira desce a serra desaguando logo ali na Baía de Antonina, enquanto o Forquilha cai no Iguaçu e cruza o sudeste do continente no Rio Paraná e no Rio da Prata, caindo no Atlântico apenas na Argentina.

Na descida da encosta há alguns trechos recém desmoronados que podem ser perigosos. Evitamos ao máximo nos apoiar em pedras que estivessem presas a paredes que apresentavam desmoronamento recente. Aos poucos o Mãe Catira vai ganhando volume e ficando plano. Passam-se alguns trechos com troncos de árvores assustadoramente grandes caídos sobre o rio. Em raros momentos vale a pena subir a encosta e ir pelo mato. Paramos para almoçar por volta das três da tarde e eu fiz um cálculo deliberadamente pessimista concluindo que atingiríamos o Salto Mãe Catira por volta das 18h00. Assustados com a notícia, devoramos os macarrões instantâneos e nos aprontamos em pouco mais de vinte minutos. O pessimismo do cálculo surtiu efeito ainda na marcha, que foi muito mais rápida a partir daí, principalmente porque deixamos de evitar de molhar os pés. Às 16h12, mais de uma hora antes do previsto, alcançávamos o cânion de diabásio.

Apesar de não saber nada de geologia e geografia física, vou expor o que entendo sobre o cânion e o Salto Mãe Catira, novamente sob o risco de estar falando besteira. Se olharmos no Google Earth para a região do Rio Mãe Catira, fica clara a presença de uma saliência no relevo, uma espinha contínua e baixa que cruza a serra desde o planalto de Curitiba até a Baía de Paranaguá. Segundo um relato da travessia que li, escrito pelo montanhista e geógrafo físico Pedro Hauck, essa saliência está no encontro de dois tipos de rocha: o diabásio no lado de cima e outra (provavelmente migmatito) no lado de baixo. O Rio Mãe Catira fura essa saliência formando um cânion. Logo depois, no desnível formado pelo encontro, está o Salto Mãe Catira. Creio que essa saliência possa ser ser considerada a divisão entre as serras do Ibitiraquire e da Farinha Seca.
Rio Mãe Catira (em amarelo) cruzando a saliência

Carlos e Thiago Mayer no cânion

Seja como for, o paredão do cânion é um tipo de formação rochosa muito interessante e diferente. Esse é provavelmente o lugar mais exótico em que passamos durante toda a travessia

De dentro do cânion vê-se que dali pra frente a caminhada é por uma região mais baixa, e nesse desnível está o Salto Mãe Catira. Logo que chegamos ao topo do salto, olhamos à esquerda e confirmamos: realmente há uma passagem para a encosta mato adentro. Nosso receio era ter que desescalar pelo lado cachoeira.

Em cima do Salto Mãe Catira

Embaixo do Salto Mãe Catira

Gustavo entrando na piscina do Salto Mãe Catira

A TRILHA DO MARCO 22 DA GRACIOSA

Às 16h55 estávamos no pé da cachoeira, prontos para seguir o último trecho sobre o Rio Mãe Catira. O rio é bem plano e bastante bonito nesse trecho, principalmente se houver sol. Andamos quase uma hora sobre o rio e às 17h49 entramos na trilha. Ali já comemorávamos a conclusão da travessia. Faltavam ainda duas horas de trilha, mas naquele momento a presença de uma trilha já era considerada luxo.

A encosta que leva do Rio Mãe Catira à Estrada da Graciosa é bastante íngreme, e por isso muito cansativa. O que deveria ser o trecho mais fácil da travessia foi na verdade o mais cansativo, sem a menor dúvida. Depois de subir e descer o Ciririca, cruzar colinas e vales, transpor cachoeiras e montanhas sem trilha e percorrer o Mãe Catira desde a sua nascente, a subida ao Marco 22 foi o primeiro momento em que nos sentimos cansados. A maior parte do curto trajeto de duas horas foi feita à noite. Eu possuía no GPS o tracklog da trilha, que às vezes fica um pouco confusa. Por esse motivo, assumi a frente do grupo quando anoiteceu, e quando eu olhava para trás via somente cinco lanternas movendo-se de forma arrastada pela floresta. Eu sentia a coluna, o Joel sentia os joelhos, o Roger sentia os ombros, e íamos todos subindo no passo mais lento de toda a travessia. Foi também a primeira vez durante a travessia que me escorreu suor da testa, provavelmente porque a neblina deixava a floresta extremamente úmida.

Eu costumo dizer que o montanhismo é a atividade que melhor nos mostra quão curto é um dia. O tempo passa muito rápido, e se você bobear a noite te pega. Às vezes alguém pergunta a hora, você responde e a pessoa repete a pergunta pensando que você respondeu a hora prevista para chegar em algum ponto mais adiante. "Não compadre, AGORA são 18h30, acredite se puder". Mas na subida ao Marco 22, no fim da travessia e quando sabíamos que não havia mais motivo para pressa pois todos os obstáculos haviam sido transpostos e já havia anoitecido, o tempo passou mais lento do que quando eu tinha nove anos e estava assistindo a aulas terrivelmente chatas na escola. Entre uma olhada e outra no relógio, passavam-se dois, três minutos. Ao passo que quando descíamos o começo do Mãe Catira, no começo da tarde, cada olhada no relógio era um salto de pelo menos 40 minutos no tempo.

Às 19h55 chegamos ao Marco 22 da Estrada da Graciosa, 13 horas e 25 minutos depois de iniciar a jornada do segundo dia na Colina Verde, após dois dias de caminhada por ambientes exóticos e desafiadores na parte mais preservada da Mata Atlântica brasileira e uma noite de chuva, apreensão e preocupação. A neblina estava tão espessa que ficou difícil dizer o que era pior: foto com o ou sem flash.

Chegada ao Marco 22 da Estrada da Graciosa

Caminhamos os 800 metros até o mirante do alto da serra. De lá, eu, o Thiago Mayer e o Roger continuamos subindo a Graciosa sem as mochilas em busca de sinal de celular. Em dado o momento o Roger conseguiu mandar uma mensagem  mas não conseguiu ligar. Mais acima ligou em casa e constatou que seu pai havia visto a mensagem e já estava a caminho. Depois de quatro meses de espera, incursões, estudos e planejamentos, havíamos concluído em dois dias a Travessia Ciririca-Graciosa.

AGRADECIMENTOS
  • Ao Julio Fiori, pela receptividade e pelas dicas precisas que foram essenciais para o sucesso da empreitada;
  • Ao pai do Gustavo, que levou o Gustavo, o Thiago Mayer e o Carlos até a Fazenda Bolinha;
  • Ao Leonardo, que levou o Joel, o Roger e a mim à Fazenda Bolinha;
  • Ao pai do Roger, que nos resgatou na Graciosa e deixou todos em casa;
  • Ao Francis Sarturi, que se ofereceu para o transporte caso fosse necessário;
  • Ao Guilherme Peron por acordar às 5h30 para nos fornecer a previsão do tempo;
  • Ao Thiago Ferreira e ao Carlos Toledo por participarem das incursões de reconhecimento.